Existem alguns motivos de ausência do empregado na jornada de trabalho que afastam a possibilidade de descontar falta do funcionário, conforme lei. O atraso ou falta ao trabalho por motivo ou trânsito estão inclusos nessa lista?
Essa é uma dúvida que afeta diversos empregadores e empregados, principalmente pelos diversos entraves apresentados pelas grandes cidades ao deslocamento rápido e seguro.
As grandes metrópoles lidam diariamente com enchentes, acidentes que atrapalham o fluxo dos veículos, greves e outros percalços que obstam muitas vezes o empregado de cumprir com seus horários e até mesmo de se apresentar no local de trabalho. Confira, abaixo, quais são as previsões legais que se referem a esse tipo de situação.
Descontar falta: conforme a visão da lei trabalhista
Para saber se as faltas provocadas por questões de força maior como enchentes, acidentes de trânsito e outras questões que fogem do controle do trabalhador é preciso analisar o que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê sobre o assunto.
A legislação resguarda as regras aplicáveis sobre as faltas e os descontos nos seguintes artigos da CLT:
Art. 462 – Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.
§ 1º – Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado. (Parágrafo único renumerado pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.1967)
§ 2º – É vedado à empresa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou serviços estimados a proporcionar-lhes prestações ” in natura ” exercer qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços.
(…)
Art. 473 – O empregado poderá deixar de comparecer ao serviço sem prejuízo do salário:
I – até 2 (dois) dias consecutivos, em caso de falecimento do cônjuge, ascendente, descendente, irmão ou pessoa que, declarada em sua carteira de trabalho e previdência social, viva sob sua dependência econômica;
II – até 3 (três) dias consecutivos, em virtude de casamento;
III – por um dia, em caso de nascimento de filho no decorrer da primeira semana;
IV – por um dia, em cada 12 (doze) meses de trabalho, em caso de doação voluntária de sangue devidamente comprovada;
V – até 2 (dois) dias consecutivos ou não, para o fim de se alistar eleitor, nos têrmos da lei respectiva.
VI – no período de tempo em que tiver de cumprir as exigências do Serviço Militar referidas na letra “c” do art. 65 da Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964 (Lei do Serviço Militar).
VII – nos dias em que estiver comprovadamente realizando provas de exame vestibular para ingresso em estabelecimento de ensino superior.
VIII – pelo tempo que se fizer necessário, quando tiver que comparecer a juízo.
IX – pelo tempo que se fizer necessário, quando, na qualidade de representante de entidade sindical, estiver participando de reunião oficial de organismo internacional do qual o Brasil seja membro.
X – até 2 (dois) dias para acompanhar consultas médicas e exames complementares durante o período de gravidez de sua esposa ou companheira;
XI – por 1 (um) dia por ano para acompanhar filho de até 6 (seis) anos em consulta médica.
XII – até 3 (três) dias, em cada 12 (doze) meses de trabalho, em caso de realização de exames preventivos de câncer devidamente comprovada.
Conforme é possível se extrair do texto legal acima, em momento algum descontar falta por questões de força maior está proibido pelo texto legal. Isso significa que em caso de ausência ou atraso por esses motivos pode ocorrer desconto salarial.
Existem alguns pontos que devem ser levados em consideração conjuntamente a esta questão. Continue lendo e confira quais são e garanta a segurança dos atos trabalhistas realizados em sua empresa.
O que diz a Convenção Coletiva de Trabalho sobre descontar falta?
É preciso que sempre sejam analisadas as disposições presentes nas convenções coletivas entre os sindicatos patronais e dos trabalhadores. Isso porque nelas são estabelecidas pelas partes regras específicas que se aplicam a sua realidade.
Não raro os sindicatos emplacam possibilidades maiores de abonos de faltas de forma a não gerar descontos. A empresa deve estar atenta se as condições referentes às ausências e suas motivações foram aumentadas nos acordos coletivos, antes de descontar faltas.
Deve-se simplesmente descontar falta em ausência justificada por motivo maior?
Essa situação é muito complicada e deve ser analisada com calma pela empresa. É necessário que se preze pelo bom senso e pela solidariedade nesses casos, utilizando-se da empatia no ambiente de trabalho para se colocar no lugar do outro.
Existem casos em que mesmo que a CLT não preveja a impossibilidade de desconto de falta o próprio empregador pode optar por não a realizar por considerar a situação injusta com o funcionário que se viu de mãos atadas perante a situação.
Considere situações em que é de conhecimento geral as dificuldades que estão sendo impostas. Para isso, lembre-se de casos de chuvas intensas que causam alagamentos e enchentes e obstam o trânsito.
O empregado mora ou trabalha nas regiões afetadas? Quais os meios de transporte seguros nesse momento? Há possibilidade de transpor de forma fácil as dificuldades para trabalhar?
Outras hipóteses que devem ser consideradas são aquelas relativas às greves do transporte público. Note que apenas os empregados que recebem vale transporte e realmente fazem uso dos ônibus ou metrô podem se valer da justificativa de impossibilidade de deslocamento.
Isso pode ser vencido perante a disponibilização da empresa em custear o valor de outro tipo de transporte (como carros de aplicativos ou táxis) para os funcionários. Caso não pretenda obter esse tipo de gasto, a organização deve refletir se considera justo esse desconto, pois a impossibilidade de deslocamento para quem faz uso do transporte público era clara.
São várias nuances que devem ser analisadas, como:
- Tipo de obstáculo;
- Quem realmente foi afetado;
- Gravidade do obstáculo;
- Possibilidades de superá-lo que estejam ao alcance do trabalhador.
Em outras situações que possam vir a obstar o deslocamento do empregado e que devem ser analisadas pela empresa dizem respeito aos acidentes que muitas vezes fecham vias, por exemplo.
O gestor pode requerer sem maiores problemas que o empregado que se diz impossibilitado de chegar no horário ou de ir à empresa por esse motivo que comprove a situação com foto ou filmagem do próprio celular.
No final da contas essas situações dependem em muito do bom senso e da hipótese concreta que se está analisando. Cabe saber apenas que o desconto é possível apesar de muitas vezes desaconselhável em motivos de força maior.